segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O vazio que parece cheio

Não direi mais o quanto a vida é tragicamente cômica.
Eu sou a falta de surpresa do Jack.
Algumas sensações vem em conjunto. Não sei até onde sentimentos nos afetam por si próprios. A solidão almejada vem acompanhada de um vazio, não é tão sozinha afinal. Acho que é isso que Kierkegaard chama de desamparo. Espero que a recompensa seja doce.
Estranho é pensar que essa angustia tem um sabor doce. Um aperto parecido com um abraço de despedida dado por um ser amado.
Amor... rodamos e rodamos, pensamos e pensamos para cair nele, e então percebemos que dele nada sabemos! E talvez nunca saberemos.
Ainda procuro uma definição ao nível do que é sentir a falta de alguém.
No silêncio, o barulho das teclas incomodam. Quanto mais silêncio mais sensibilidade.
As batidas do coração começam a incomodar. O vento é teu amigo.
No silêncio só o nada é companheiro. Saudoso nada.
Acho que cheguei onde queria.
No nada se encontra tudo.
Nada.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Um dia de trabalho

Na vida o humor é o ar.
Enquanto vivemos respiramos o oxigênio da ironia. Sorrimos ao levantar de manhã, ao tropeçar em um fato cômico rotineiro.
A vida é uma piada.
As mulheres são uma piada. E nos gostamos de piadas. Gostamos de estipular objetivos. Nas gargalhadas temos a ilusão de sermos felizes. O humor afeta nosso entendimento do que de fato nos faz bem, semelhante ao álcool, mas talvez a ressaca seja maior.
Tragicamente a vida ri.
Anda-se para chegar a lugar nenhum. Comemora-se a simples quebra da rotina escravizante. Procura-se a vitória sem recompensa alguma. Queremos nos sentir completo.
A vida ri.
A morte mata.
O nada é o céu.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Azul calcinha

"E se o céu fosse aqui?" disse o galante rapaz a tua amada. "E se a vida, esse mar de caos e lamúrias, fosse o que as pessoas chamam de outro mundo?". As dúvidas reinavam em tua cabeça. Ali na cama de um motel fulera na 24 de maio, ele não conseguia pensar em outra coisa. Sua querida nua de bruços, balançando seus pés ao léu, com o lençol da cama molhado por sobre a bunda, naquele momento ela viajava em seus próprios pensamentos, enquanto acendia um cigarro ignorava o que ele dizia. E ele prosseguia normalmente: "O que teria de bom no céu que não podemos encontrar aqui? Afinal Jesus se constituiu homem, e está vivo agora afinal como dizem. Então porque diabos não podemos simplesmente viver nossa vida? Essa espera talvez seja mais depressiva do que o inimaginável inferno." E como quem não liga a mínima, a senhorita pelada, tragando forte o cigarro, interrompe o galante amado atravessando a conversa. "Aquela hora em que eu fiquei de quatro você bateu na minha bunda? Aquilo foi um tapa não foi? Porra... Estou vendo a marca dos seus dedos aqui no meio da minha bunda." O rapaz desconcertado, como quem perde o rumo do assunto em que disserta, pára um segundo pra pensar e diz: "Acho que foi! Não lembro... Enfim, a unica coisa palpável na vida afinal são as desgraças, dizia Schopenhauer, o que julgamos ser bom, é na verdade a ausência de uma coisa ruim. Os infortúnios, esses sim são sentidos. Mas de qualquer forma deve ter em algum lugar da bíblia algo que Jesus tenha dito que se possa interpretar como sendo nossa vida terrestre o céu que Ele pregava. Se há quem diz que se pode viver o céu na terra, acredito que seja esse o único céu que Jesus se referia. Não que a idéia do céu transcendental me pareça ruim, eu só penso que o que virá depois da vida que Deus nos deu, é algo que não cabe a nós julgar melhor do que o que nós temos aqui. Desconhecemos qualquer coisa relacionada a ela."
 Nesse momento a pequena moça se encontrava de pé se dependurando na parede tentando por sua calcinha azul. Depois de uns minutos tentando, ela estufou os peitos, olhou para os mamilos, respirou fundo olhou lentamente para o teu amado, e novamente respirou fundo, dessa vez com menos intensidade, caminhou até alguns centímetros próximos da cama onde ele estava e despreocupadamente disse: "Eu não sei porque você começou a falar sobre isso, nem consigo imaginar porque isso veio a tua cabeça. Me desapego de qualquer tipo de fé. Nós trepamos por várias horas. Você me disse, hora coisas boas, hora coisas estranhas, hora somente sussurros incompreensíveis. Me deu um tapa na bunda. No fim das contas de certa forma eu concordo contigo. Acredito sim como Schopenhauer que a vida é um poço de misérias sem uma ordem certa. Mas existe afinal como colocar Deus no meio disso tudo e não parar para pensar que talvez o céu poderia perfeitamente ser aqui na terra? O céu seria uma escolha, não um lugar. Um querer, sartreniano. Um fruto da nossa essência, o querer que nos molda. O livre-arbítrio seria a chave. Foi Ele que nos deu, porque exclui-lo? Só te digo uma coisa..." Ele surpreso e instigado rapidamente pergunta: "O que?" e ela com um sorriso esboçado no rosto, tira a franja negra que escorre por sobre seu olho, respira fundo olhando fixo para ele e diz: "Se você em alguma ocasião qualquer durante toda a nossa vida, se atrever em qualquer hipótese que seja, espalmar novamente a porra da minha bunda! Eu faço você responder todo esse questionamento pessoalmente!"
Ele pagou o motel.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Ele e ela

 - O que você vai ser quando crescer?
 - Você quis dizer “o que você quer ser...” certo?
 - Eu disse o que eu quis dizer.
 - Não sei. Tem como alguém disso saber?
 - Eu sei! Sei bem o que vou ser.
 - Oras! Diga-me então!
 - Serei menos do que ontem e mais do que amanhã. Agente vai se desfalecendo...
 - Hum... O que você vai fazer no fim-de-semana?
 - Provavelmente o que você for sugerir a seguir...
 - Mas você não sabe ao certo o que irei sugerir, como pode ter se decidido?
 - Bom... De hoje até sexta-feira, serei menos do que agora sou. Logo... Não quero perder tempo analisando a sua proposta. Dessa forma eu tenho a ilusão de que ganhei um pouco de vida na terra.
 - Você é meio doido... Mas eu gosto.
 - E eu meio que gosto de você... Mas você é doida.
 - Eu doida?
 - É! Você!
 - Porque? O doido aqui é você!
 - Sim! E quem convida um doido para fazer algo no fim-de-semana é o que?
 - Oportunista!
 - Mas a mulher aqui é você!
 - Ah! Não quis dizer no sentido sexual!
 - A sim... Para que o oportunismo então?
 - Não são os loucos aqueles que olham para o mundo de uma maneira diferente?
 - Acredito que sim.
 - Então. Estou bem cansada desse mundo que eu vejo.
 - Já te falei que eu te amo?
 - Não! Nós acabamos de nos conhecer!
 - A sendo assim não direi...
 - Como assim? Como você consegue conter um sentimento desses?
 - Eu nem sei o que é o amor.
 - Então porque ia me dizer que me ama?
 - Porque você me parece um pouco o que eu imagino ser o amor.
 - E como seria isso?
 - Hum... É como aquele tipo de coisa que você não faz ideia que existe, nem como funciona. Então num belo dia você acaba, acidentalmente, encontrando-a por acaso. Você descobre algumas coisas sobre ela e acaba sentindo algo.
 - Puxa... isso foi muito bonito! Nunca me disseram nada parecido.
 - Eu sei, eu sou doido se lembra?
 - É... faz mais sentido agora.
 - Se faz sentido, afinal, você está curada!
 - Curada? Do que?
 - Da loucura! Ela não faz sentido. Ou estaria eu curado?
 - É mais provável você estar. Faz mais sentido. Haha!
 - É... faz.
 - Está quente aqui né?
 - Pois é... Deu uma esquentada...
 - É...
 - Bom, eu acho que te amo.
 - Legal!
 - É... É bem legal mesmo.
 - Está gostando?
 - Do que? De amar? Sim, é uma sensação boa.
 - Superestimado?
 - Talvez...
 - Eu acho que te amo também.
 - Legal... Como se sente amando?
 - É bacana... Da uma coisinha no estômago.
 - É verdade... Dá mesmo.
 - Será que amor tem algo a ver com o que agente come?
 - É... Ahaha! Acho que sim...
 - Bom... foi legal amar você.
 - É... foi bom também, te amar.
 - Quanto eu devo?
 - Hum... deixa eu ver... Dois cafés e uma rosquinha... Quatro e cinquenta!
 - Ok! Tome! Fique com o troco!
 - Obrigado! Até mais ver!
 - Até...