segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Da arte de escrever

Se escrever fosse como comer, seriamos obesos romancistas, ou morreríamos de fome.
Sou acima do peso e escrevo. Como mais do que escrevo, e tenho vontade de escrever mais do que fome. Sou estupidamente ilógico. Minha escrita irracional não sacia minha fome de escrita.
"Será que escrevo?" pergunta o gordinho jogado no sofá.
Se alterarmos a forma de linguagem e trazermos a carga social de conteúdo sexual que impele o verbo "comer" sou um completo analfabeto. Fiquemos no ato de ingerir comida para sobreviver.
Fato esse que levanta uma questão válida para tal análise. Eu como por que preciso ou como porque meu desejo está num nível tão extremo desregulado pela televisão que me vende uma vontade antes inexistente com seus hamburguês infláveis e suas guloseimas cancerígenas? Se a resposta for: "Sim! Eu como igual a um porco o tempo todo porque assim me foi condicionado." Então seria possível criar um desejo de escrita que alimentado por constantes insertes de romances russos e extravagancias liberais de língua francesa me tornasse enfim um glutão autor de obras-primas?
"Porra nenhuma." disse o gordo triste jogado no sofá.
Escrever não é comer.
Balzac que me perdoe mas ler inúmeros romances, mastigar dezenas de contos e dissecar antologias não me dão a capacidade de ser um escritor. Deveria mudar para frança, viver em casas noturnos, mendigando aos pés da aristocracia judaica uma refeição ao dia, alimentando meu ser de momentos sórdidos para assim trazer em uma obra toda a prepotência digna de dizer que sim! sou escritor de profissão, como os revolucionários (geniais) sexualistas da era moderna?
"Não sei" lamentou o gordo jogado no sofá.
Nas lamúrias do não escrever datilografo as letras consecutivamente.
Se formam magicamente palavras aleatórias.
Aplico uma pontuação medíocre para me fazer ao menos inteligível.
E se talvez tu poderes ver algum sentido, quem sabe?
E se me abstenho da vontade condicional de comer, ao menos um instante, voltando assim a simples necessidade de comida.
E se nesse tempo fosse livre? E se escrevesse bem? E se completasse cada prólogo que inicio?
E se escrever fosse como comer?
"Nada" disse o gordo sonhador.

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