terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Uma vida a se desperdiçar

Aquele desconforto, um esboço de sentimento que não se manifesta, permanece inócuo, como uma possibilidade, sempre uma possibilidade.
Uma falta de coerência lhe vem frente a ela, sempre a imagina perto, desfiando com os dedos o cabelo negro, enrolando o que era pra ser liso; ele insiste em sustentar, na tentativa de tornar sólido aquele fel que é imaginá-la: uma vida a se desperdiçar ao lado dela num sofá.
Levanta pra fazer café. Imagina que ela prefere doce, forte, coado a mão jamais cafeteira, uma levianidade digna de um pensar sobre ela.
Sentir-se conjugue só.
Na cena típica onde o buquê de flores levita sob o salão enfestado de vestidos de cetim, ela sempre evita agarrar qualquer coisa, para ele comprometer-se é perder-se, fato que reforça em seu âmago a mesma justificativa que o torna sóbrio perante o fato de estar solteiro aos vinte e sete anos de vida social. Comprometer-se, no momento, somente ao fenômeno de pensá-la.
Na melhor das hipóteses, no melhor dos cenários, ele ira cruzar os passos com os passos de sapatilha errante dela; aquela hipótese onde tudo já é premeditadamente dito, tudo é som, a linguagem pré-humana do olhar figurara os símbolos de um diálogo que já ocorrera, no interior inatingível de ambos.
Não resta mais nada além. Sem linguagem ficamos ambos no olhar vago de um afeto eminente porém amordaçado, vagando na articulação de um amor inconjugável, por isso infértil na concretude do real, mas fértil na imaginação.
Novamente uma vida a se desperdiçar ao lado dela.
Por esses longes todos...
Por um fim.

Um comentário: